sexta-feira, 22 de agosto de 2008

E AS ALGEMAS? - de Jackson Vasconcelos

O brasileiro é, por excelência, palpiteiro. Temos opinião formada sobre quase tudo. Dissertamos sem dificuldade sobre conserto de automóvel, física quântica, corrupção, bíblia, orixás, futebol, política, arte, samba, guerra na Geórgia, trânsito, novelas, crime organizado, casamento gay, discriminação da mulher, micro-crédito, taxas de juros, inflação, remédio para o fígado, qualidade de aeroportos, preço das tarifas bancárias e até sobre as relações incestuosas do Lula com o Salmão e com o Piraju Dourado.

Faltava-nos, contudo, conhecimento mais profundo sobre algemas, assunto, pelo jeito, de absoluto interesse nacional.

Com o tema colocado na pauta da imprensa, o Brasil todo embarcou na discussão e eu não teria mais o que dizer aos amigos, nas nossas rodas de conversas, se continuasse a ignorar o assunto.

Então, parti para os estudos e deixei de lado por algum tempo a leitura dos relatórios que indicam que um em cada cinco homicídios cometidos por aqui tem a autoria de um policial – dados da Secretaria de Segurança Pública; que falam sobre a vida de 180 mil presos ainda sem julgamento, quase todos eles negros e pobres – dados do Ministério da Justiça - e sobre os 680 adolescentes infratores presos em situação ilegal - dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República.

Comecei meus estudos com o trabalho de encontrar o significado da palavra. Houaiss informa que algema identifica um instrumento de ferro, constituído basicamente por duas argolas interligadas, utilizado para prender alguém pelos pulsos ou pelos tornozelos. O escritor Deonísio da Silva, autor de “A Vida Íntima das Palavras”, informa que o vocábulo é derivado do árabe, aljámi’â (pulseira), nome dado aos adereços sinistros que servem à pratica do sadomasoquismo e para conduzir presos e humilhar suspeitos.

No campo legal, o termo aparece no artigo 199 da Lei 7.210, Lei de Execuções Penais: “o emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”. Como é uma lei de execuções penais, imagino que a referência seja ao emprego de algemas no caso de presos e não de práticas sadomasoquistas. Mas, só imagino sem ter certeza absoluta, porque o legislador brasileiro, principalmente depois que o Lula foi diplomado na profissão, passou a adotar a mixórdia como lema de trabalho. É possível que o governo queira disciplinar o emprego de algemas também nas relações sadomasoquistas. Afinal...

Em todo caso, como até hoje não houve decreto federal para disciplinar o indisciplinado, os tribunais e advogados cuidam o tema à luz do Código de Processo Penal, principalmente nos espaços em que ele aborda o uso da força no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.

Como se vê, o assunto é rico e não pode ser tratado com pouco caso nem em pequenos espaços. Por isso, não vou mais longe. Percebo que ele merece trabalho mais elaborado. Talvez um compêndio, com exame da biografia do criador do apetrecho e verificações sobre o seu poder transformador. Afinal, estamos diante de uma questão que, por sua essencialidade, há duas semanas ocupa a atenção de toda a imprensa, da Polícia Federal, do Ministro da Justiça, do Presidente do Supremo e até do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e mesmo do preso de alta qualidade, senhor Luiz Fernando Costa, o Fernandinho Beira-Mar.

*Jackson Vasconcelos é editor do site www.estrategiaeconsultoria.com.br

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