domingo, 11 de maio de 2008

O DEGOLADO -sexta parte

Os professores da tese do segredo do universo não faziam a menor idéia que uma simples e corriqueira reunião de departamento de uma faculdade, onde foi apresentada uma concepção que ninguém tinha conhecimento imediato, fizesse uma repercussão em nível estadual, envolvendo políticos, religiosos de toda ordem e uma gama da sociedade. Para o professor Edgar, principal defensor das idéias cíclicas do universo, ele não contava e não tinha pretensões para o montante de discursos que se formou em torno de suas observações. Enquanto pensava sobre isso viu ao longe, dessa vez da sala do departamento, a figura do velho todo de branco. Não se assustou, nem esboçou nenhuma reação. Apenas prestou atenção e observou. Uma frase chegou dentro da sua cabeça:
_Não cometa o mesmo erro, procure se lembrar...
Uma angústia repentina tomou o professor Edgar por instantes. Lembrou-se do sonho e das palavras do dialeto, para ele, o portal para outros ciclos e talvez as palavras fossem um espécie de código. Deveria haver alguma ligação concreta daquelas visões com o que ocorrera em vidas passadas. Talvez seu encerramento tenha sido traumático. Que falha cometera de tão grave a ponto de visões mediúnicas aparecem para ele subitamente e pedir para não repetir o erro? E aquela nuvem de poeira cósmica em formato de homem? Se aquele velho todo de branco existia, estava por vezes se deixando ver, então aquela nuvem de poeira cósmica, possivelmente poeira cósmica, conseqüentemente também estaria por perto. A resposta para ele estaria, quem sabe, na regressão através do sonho. Para o professor Edgar, haveria provavelmente uma energia psíquica instalada em nosso cérebro onde guarda todas as informações possíveis da vida de cada um de nós e que nos acompanha através dos ciclos. Como uma caixa-preta de avião. Durante suas leituras sempre até as portas da madrugada, o professor sempre acabava cochilando e entrando em sono profundo, como das outras vezes. “Lá yá tú ká, lá yá tú ká...” “Ranti, ranti...” E sonhou novamente. Dessa vez viu um indivíduo muito parecido com o professor Ventim, estava metido em um hábito, como sempre, sisudo e severo. O tempo provavelmente também era medieval. Havia também um salão grande, com janelas em formato gótico. Possivelmente uma igreja ou catedral. E mais pessoas. Aliás, uma multidão dentro e fora do salão, ou da igreja. Cavaleiros armados. E o velho todo de branco acompanhando uma pessoa envolta em um manto e encapuzada. Era uma missa ou procissão, talvez reverenciando um deus ou santo. As imagens estavam mais claras, contudo os fatos ainda eram confusos. De repente o elemento ou indivíduo feito de poeira cósmica atravessou os ciclos numa rapidez anos-luz e então o professor viu-se na cadeira do escritório, prestes a tomar uma queda em conseqüência do cochilo sentado. Era o telefone. Incrédulo e assustado, ele teve que explicar a alguém do outro lado da linha que se dizia secretário da arquidiocese, todo o processo da tese do segredo do universo. Sem mais nem menos, o interlocutor o criticou e ordenou que parasse de tornar público as fraudes e as fábulas que os professores urdiam e imaginavam sobre a vida. Aquilo era, ainda o interlocutor, sem dúvida corrupção de valores e que ele não tinha idéia do mal que causaria a todos se essas leviandades continuassem a se estender nas ruas, salas e corredores públicos e privados da sociedade. O professor tentou argumentar que não foi ele quem causou tal estardalhaço e bulha que descontentasse as pessoas. Ele, ao contrário do que o interlocutor dissera, só levantou uma tese entre tantas a respeito da criação do universo. E ouviu alto e em bom som.
_O CRIADOR DO UNIVERSO É DEUS!!!
Ouviu também o clique do aparelho e a linha telefônica desocupada.
Em seguida, ao voltar-se da cadeira para colocar o aparelho na base, pôs os olhos em cima da mesa e percebeu uma gravura de um livro antigo e empoeirado onde se sobressaía o desenho de uma nuvem de poeira cósmica, parecida com a que o acompanhava nos sonhos, designada por quem pintou de TEMPO. Olhou o livro e não o reconheceu. Procurou na estante de sua biblioteca e mais uma vez não lembrava da existência daquele exemplar. Era um livro místico, misterioso e alegórico com muitos desenhos e figuras. Olhou novamente e reconheceu o TEMPO. Era ele quem andava serelepe, lépido e vasto mais que anos-luz através dos ciclos. Ele quem o levara a era medieval e provavelmente fora o TEMPO quem colocara aquele livro ali. Olhou novamente a pintura e estava assinada por Nicolau. Folheou e viu que havia desenhos de planetas em órbita. Havia também uma figura da Terra em movimento circular e, a mesma Terra, acompanhada por outros desenhos dela própria como se fossem em três dimensões, onde aparentavam ciclos circulares. O professor Edgar tinha quase certeza que conhecia aquele esboço e o risco. Que já o vira em um dos seus livros de pesquisa. Não fosse tarde, a aula que daria logo mais às sete e trinta da manhã na faculdade e o sono que chegava silenciosamente, ele procuraria aquele desenho.
SÉTIMA PARTE quarta-feira 14/05

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