sexta-feira, 10 de outubro de 2008

UM SONETO DE JOÃO JUSTINIANO E MINHA CRÔNICA DOMINGUEIRA-de Clevane Pessoa

Acordo,domingueira , lá fora a umidade da madrugada chuvosa.
Cuido de mim , de tudo que é vivo aos meus cuidados:o cãozinho Lucky, as plantas, nos beirais, alimento para os pardais, as rolinhas.
E, no meu "hospital de plantas"-uma bancada onde deixo vasos com verdinhas que precisam recuperar a cor, galhos a serem entalados entre paus de fósforos, de adubação, etc-coloco um pedacinho de bolo.As formiguinhas em breve, descobrem farelos de alguma coisa largada pelo quatro-patinhas...Assisto aos preparativos:procissão ou combate?Desfile militar ou caminhada de pigmeus?A revoada de um beija-flor faz-me erguer os olhos.Ele bebe néctar das corolas das flores rosa-pêssego dos dedinhos-de- diabo, muito crescidas, que catei nuns degraus, mirrados e sujos de poeira...Outro aparece e os escorraça.As lindas e pequenas aves são belicosas, defendem terrítório.
Corto um galhinho de hortelã.Velho cheiro conhecido...Encano um galho quebrado pelo gatinho noturno que não conheço:dois paus-de-fósforo, durex.O sol aparece tímido.Venho escrever...


Abro o PC. Recebo um soneto do João Justiniano.Aliás, eu só soube que era soneto, quando o colei aqui, pois no corpo do e-mail, desconfigurado, conforme muitas vezes ocorre,ele veio longíineo,qual um adolescente quase palavra abaixo de palavra.
Li e achei muito interessante.Claro, tudo que fala de asas (os leitores sabem que asas, água e lua são recorrentes em meus poemas- desde que eu era menina- merece minha atenção.Mas há algo mais:há tempos, por ser psicóloga e também intuir, quais todas as mulheres, as histórias que se somam e subtraem na Internet.

Muitos amores e até paixões surgem.A amizade e a solidariedade florescem.Entre pessoas a quem já jamais se viu, sentiu o cheiro, beijou a mão, a boca, ou segurou nos braços.Muitos fazem amor apenas com a força cabalística da palavra.Com o imaginário alado e criativo.Muitos até se dizem Poetas, embora não o sejam , muitas vezes lançando borrifos sobre uma boa prosa, porque passam a escrever versos.Montadores de vocábulos, rimas,formas.De vez em quando, produzem algo de maior valia.E, no meio da cascata dos Poetas verdadeiros, quem não aprenderia?Mas por que querem falar em versos?Ora, porque a Poesia é a língua dos apaixonados, que sempre buscam inovar-se, recriar-se e recriar o outro.É a língua dos anjos.A dos espiritualistas, dos crentes,dos místicos, dos mágicos e das feiticeiras.O próprio conceito de Deus exige um esforço poético.

E o interessante na Internet, é sua mágica, ou mesmo sua magia:quem explica de onde vem esse poder que se passa a ter? Idade torna-se dado secundário, às vezes, até omitido.( O poeta João Justiniano, abaixo, quando fala de forma universal, generalizada e indireta sobre a relações do sêr- dele próprio também -com o espaço de ser, escreve:"o tempo não me importa, nem a idade".E esse é o grande atrativo do espaço cibernético.Nele, as pessoas são.Gênero,raça, idade, tornam-se fatores secundários num relacionamento).
Profissionais estressados podem se dizer surfistas.Trilheiros podem se informar doutores.Talvez formados pela Vida-Universidade completa.Impotentes podem viver sua maior potência, que é a mental e fazer amor conforme fazem os que sabem.

O imaginário é tão amplo, que é mesmo imensurável:sem limites, sem limitações.
É evidente, se tantos precisam de máscaras e muitas personas, muitas vezes dividido porque deseja multiplicar-se,há os que são, embora impalpáveis no sentido físico, verdadeiros, elas mesmas :pessoas que, muitas vezes, experenciam , pela primeira vez, o direito de expressão.Donas de casa ousam .Velhos provedores de casamentos falidos, abrem outras comportas e passam a suprir-se .E a suprir quem está do lado de lá.E a pessoa que excita,esquece que ...o fruto da excitação será ,provavelmente, usado para a pessoa que dorme ao lado de quem se excitou.Mas sonhar é preciso!

Há uma onda de adultério não caracterizado legalmente, que pode beijar as areias de praias na amorosidade incondicional, mas também podem provocar Tsunamis -e trazê-las qual uma catástrofe.Uma paciente minha queixou-se:"Encontrei o fulano escrevendo um e-mail picante e com uma bruta ereção.Depois, decerto, ia se masturbar.E comigo, sua esposa, do lado".Chorava a ponto de sufocar-se.

Pela telinha, há, na maioria das vezes, a certeza de que pecado não existe.E soltam asas.Alados, voam um até ao outro.E dentro desse enfoque de solidão, já há a traição internética;"Ela ,ele,se correspondia, com o mesmo nick (ou com nicks vários!), com muita gente e eu já estava apaixonado (a) ".Parece gravíssimo, ao traído.Qual uma lésbica cuja companheira engravida de um homem, evidentemente sente-se .Ou seja, a lógica da filosofia de vida dos internautas, é: "lá fora, na vida real, somos assim e assado.Aqui,na virtual, somos um para o outro".Há os que se entregam , qual a uma proficssão de fé.

Todas as pessoas se sentem um pouco donas de seus companheiros.Donde a liberdade a dois é uma necessidade, mas quase um mito.Postegar-se ao outro o ser feliz.Somente a pessoa a quem amo, pode conceder-me a felicidade.e isso, é um engano, um erro cultural antiquíssimo, para quase todos os povos.

Existe uma nova moral, inegável, após o advento da Internet.Se antes as fantasias eram extrapoladas ao traveseiro, no banheiro,inconfessáveis, agora, em frente à telinha," tudo pode".A fantasia atingiu o terreno do possível.

E, notem bem , não falo aqui de atos pornográficos, pedofilia, nada hediondo.Apenas de almas normais e sequiosas de atenção.Apenas o erotismo se desenroscando do ser, onde fôra subjugado por convenções:a serpente Kundalini, dormitava na base da espinha e, em frente ao computador, desenrola-se, sobe pela coluna vertebral do Internauta e até dança ao som da amorosidade que cria músicas hipnóticas vivas e/ou própias.Não a serpente bíblica, que induz ao pecado.Não há pecado abaixo do Equador? Não há pecados na Internet! Pelo menos, não oficialmente.Então, a maioria, transige.O que? Depende do que quer ou pensa ou faz.Ou escreve, claro.

Uma de minhas pacientes me dizia que tomava banho, se vestia e penteava - quiçá, perfumava-se - para falar com o namorado.Pela Internet, entre bytes...O encontro marcado certo.E enquanto o marido bruto dormia.E isso, sem contar que , do outro lado, o "amante" -aquele -que -ama talvez estivesse de cuecas, embriagado, ou precisando de banho.

Muitas vezes, a energia flui de tal forma que muitos atravessam oceanos para conhecerem as musas inspiradoras, as mulheres românticas e sensuais com quem se correspondem.Os homens viris e sedutores.Às vezes, há decepções.Uma de minhas alunas da Oficina de Contos, no CCSB (*),contava-me que um rapaz de família simples, recebeu da correspondente, as passagens, e atravessou o país para conhecê-la.Ela usara recursos de fotoshop e
pareceu-lhe muito mais velha que ele.Se nos e-mails, MSN, ou antes, o ICQ, o rosto é um , ao vivo, poderá ser outro.Restou-lhe apenas a voz dela, a amargura de ter sido ludibriado, despistada com muitos passeios e carinhos.Voltou deprimido,amargurado.

Mas há os que se apresentam quais realmente são.E se apaixonam , se entregam , se buscam.E se casam.Conheço pelo menos três casais muito bem casados, a partir da realidade que buscavam e encontraram.Fugir da mononia.Não obedecer a regras .Libertar-se.Ser.

Daqui a uns tempos, a Lei fará Leis referentes a "trair sem sair de casa', "trair por e-mail", falsidade ideológica essencialmente virtual, etc.Pois assuntos de tais golpes dados em mulheres frágeis, já acontecem fora da telinha.

A a "dura Lex, sed Lex" (**),basear-se-á nas mesmas normas, mas com setas específicas para internautas.E quando se tratar desse tipo de violência contra a mulher, ela será específica :enganada virtualmente.Chantegeada pelo internauta de nick tal...E por aí vai...

Mas, depois desse parênteses, retorno ao soneto de João Justiniano.
Que trata da sensação de paz e liberdade que se experencia em frente ao computador.Da liberdade plena ("aqui,eu sonho e gozo", atesta-se o sonetista).De reviver os tempos da juventude ("o ardor da novidade', "em pleno reverdor").

E nesse redescobrir-se, ele, que no primeiro verso do primeiro quarteto, afirma que o paraíso está dentro de sua própria casa, depois reconhece mais,esse poeta alado :"Sou eu o paraíso".
Adorei, pois ritmo e precisão, João Justiniano nos mostra que a forma mais bela e simples de encontrar a felicidade, é encontrar-se.O paraíso existe e está dentro de nós mesmo!

Clevane Pessoa de Araújo Lopes
Poeta Honoris Causa,pelo Clube Brasileiro de Língua Portuguesa
Diretora Regional do Instituto de Culturas Americanas.
Embaixadora Universal da Paz. O soneto do jovem poeta sem idade ;PARAÍSO
18-01.08
João Justiniano

http://www.joaojustiniano.net/

O paraíso está em minha casa,
aqui à frente - no computador.
Aqui eu sonho e gozo, vivo o amor
e a iluminação que o sonho abrasa.

Aqui, senhora, vem e não se atrasa,
a íntima paz de quem revive o ardor
da mocidade e em pleno reverdor,
e ainda quer voar, que o vôo o apaza.

Sou eu o paraíso. Em febre estala,
arde-me o coração e o sonho embala
como ao filho, no colo, em feriado...

O tempo não me importa, nem a idade.
A vida é simples na felicidade
de ser eu mesmo e ser poeta alado...

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