sábado, 29 de março de 2008

O ESTUDANTE



Conheci a Marcele por uma manobra do destino. Talvez não, talvez eu tivesse que a conhecer realmente para transpor ou deixar para trás o caminho espinhoso e a tormenta a que fui submetido em provavelmente mais de um terço da minha vida.
Já contava com trinta e três, não era, portanto mais nenhum menino adolescente ou um jovem pródigo em busca de aventuras. De qualquer forma nunca fui de festejos. Fui criado numa austeridade orgulhosa e religiosa de minha mãe. Muitas coisas da vida eu fiquei sem saber até os vinte e oito, trinta por aí... Só soube devido a, acho eu, a genealogia curiosa que herdei de meu pai. Minha mãe vivia com a cara e o resto do corpo metido numa igreja católica. Muito séria raramente ria ou encarava alguém. Na sua empáfia, falava sempre com as outras pessoas fazendo pouco caso, procurava em qualquer ocasião algo fora do contexto do interlocutor e não se dignava de olhá-lo no rosto, como já dissera, então respondia dando de ombros e sempre lendo a Bíblia. Uma obliqüidade que copiei por algum tempo. Na verdade havia ao redor de minha mãe, na sua atmosfera, uma comoção perturbadora que a fazia sofrer. Acanhada, triste e descontente. Uma vez tive a impressão que minha mãe suspirava sozinha ao canto do quarto, quando de repente entrei para lhe falar sobre minhas notas de Latim, ela segurou e abriu a bíblia num reflexo de dar inveja a qualquer goleiro. Por osmose adquiri os trejeitos de minha mãe e com as lições de Latim, que a principio detestava, passei a ler, ou melhor, estudar sistematicamente o Novo Testamento. O que a levou a uma transformação aliviante, como se estivesse consolada por algo terrível que acontecera. E dessa forma aquiesci ao ver minha mãe respirar tranqüilamente. Mesmo assim, ao tomar conhecimento da Primeira Epístola aos Coríntios, quando São Paulo chegou a Corinto, que enveredei de vez no mundo religioso, com medo do pecado incestuoso. Não que tivesse desejo por minha mãe ou por minha irmã que era totalmente contrária a mim, apesar de mais nova. Mas ao saber dos amores entre neófitos e madrastas contagiados pela Sodoma pagã, tive medo de me corromper no vício sexual. Notei muitas vezes o olhar desconfiado de meu pai. Muxoxava e balançava a cabeça num gesto negativo. Nunca entendi aquela atitude dele. Só mais tarde com Marcele que vim saber o real significado de tanta dissonância.
Aos poucos e com a anuência de minha mãe mergulhava mais e mais no mundo monacal. Seguia firmemente para tornar-me monge, rezar missas, reunir o rebanho e amar a natureza como o Pastor Amoroso de Caieiro. Por sinal era somente o que eu conhecia fora os apóstolos, Fernando e seus heterônimos. Tentei escrever poesias como ele, mas uma vez durante a ronda religiosa da noite, uma espécie de zelo virginal, para impugnação e extirpação de qualquer manifestação calorosa do sexo, o santo padre e sua trupe ministerial do clero não contou conversa. Flagrou minha leitura de “O GUARDADOR DE REBANHOS” e imediatamente, num impulso colérico arrancou de minhas mãos os papéis e me fez comê-los.
_ORAI E VIGIAI! ORAI E VIGIAI!
Bradou firmemente o padre Sólon sem cerimônia, na frente de dois outros ministros da igreja e monges da alta cúpula. Como castigo fui compelido a dois dias de jejum total. Quarenta e oito horas sem comer nada, só bebendo água. Além de, nessas quarenta e oito horas, rezar o terço duas mil vezes implorando o perdão do senhor. Aquilo me deixou confuso e muito chateado, pois Fernando não era nenhum devasso literário, pelo contrário. Fernando havia se preocupado, em uma época, em interpretar os sinais divinos que Cristo, Nosso Senhor, havia deixado para Afonso Henriques como armas do Reino de Portugal. “Benedictus Dominus Deus noster qui dedit nobis signum”. Fora essa frase que me chamara a atenção sobre o poeta e por ela que comecei a lê-lo. Ora, quando levado à presença do padre Sólon, tentei argumentar-lhe a respeito disso.
_Sempre louvando a atitude tomada pelo senhor, Grande Mestre, e longe de contestar ou me opor à inteligência divina herdada pelo santo padre Sólon, gostaria só de mencionar em minha defesa e em defesa do próprio Cristo que a obra e o autor em questão não são mundanos como imaginas nosso Santo Padre Sólon... Tenho a dizer-lhe a frase que me seduziu e me levou à leitura do poeta português... Assim diz ele em um apontamento para a abertura de um de seus livros “Bendito Deus Nosso Senhor que nos deu o sinal...” Então, em vista dessa leitura, das palavras mencionadas ao Bendito Deus Nosso Senhor e tomando como alicerce as palavras do poeta a respeito do “Guardador de Rebanho”, pus-me a ler...
_O Estudante com sua reles oratória e seu cântico comum aos pecadores não quer lecionar para mim a literatura portuguesa, imagino eu... Contudo devo lembrar-lhe da grave falta que gerou com a leitura de autor penitente... Não me olhes assustado ou com indignação, Estudante, pois sei muito bem o que fez esse senhor português que se diz poeta do Modernismo para notabilizar-se nas Letras... Saiba o senhor que o único que se divide em infinitos seres é ELE... Aquele que está sentado no centro do céu, criador de todas as criaturas do universo e que nós, principalmente nós aqui, no mosteiro, temos que louvá-lo diariamente, freqüentemente com orações e dor... Sacrifício e penúria sem nos ater a qualquer outro ser ou outra palavra que não seja a DELE... Devo dizer-lhe, Estudante, que depois da invenção do senhor Gutenberg, durante a santa inquisição da igreja, os documentos sagrados foram violados e livros como este que o senhor lia com tamanha avidez proliferaram e usurpam até hoje a mente do homem comum...Esta é a sua falta, Estudante, agiu como um homem comum... Saiba o senhor que desde que entraste aqui para orar pelo mundo, deixaste de ser um homem... E o pior, corrompeu-se por um pecador que se dizia reinventar ele próprio e com versos satânicos ataca o divino... Me olhas, Estudante? Então o que me diz destes versos? “Pensar em Deus é desobedecer a Deus, porque Deus quis que o não conhecêssemos, por isso se nos não mostrou...” (e continuou com os olhos injetados de fúria e uma certa volúpia) Se não bastasse a falta de pudor e indisciplina da sua parte... Para terminar, Estudante, vou repassar agora para você as suas, as nossas, atribuições e princípios aqui dentro... Então, temos o DEVER de orar, orar e orar... Temos senso de JUSTIÇA, COBRANÇA E CULPA sobre nós mesmos, HIERARQUIA, TRADIÇÃO, HONRA e sobretudo PUDOR E VERGONHA do corpo...
Mas o que isso tinha a ver com minhas leituras de Alberto Caiero? Passei dois dias trancado e isolado dos outros numa espécie de solitária dentro dos matos selvagens que circundam o mosteiro. Não sei se conseguir rezar o terço duas mil vezes, nem se queria então o perdão do Senhor. Veio então na minha memória fragmentos de fatos ocorridos comigo mesmo. O muxoxo de meu pai e o balançar negativo de sua cabeça. Minha irmã e suas amigas me chamando de coitado. Minha mãe exortando em mim o desespero infeliz e insidioso para me sentir culpado. Minha mãe sempre lia para mim a passagem de Jó no Velho Testamento. “No dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o Senhor, veio também Satanás entre eles”. Lia em voz alta, gemida, que denotava uma tristeza fúnebre no fundo da alma.
Depois das quarenta e oito horas afastado na solitária eclesiástica, saí ainda sentindo um vazio, um ar sem sentido em torno de todo o fato ocorrido. O santo padre Sólon e o ministro da cúria José Trasímaco deram-me ordem para estudar durante todo o dia seguinte o Livro Sagrado do Mosteiro. Estudar novamente, diga-se. Os três tomos, cada um tinha cerca de seiscentas páginas. Confesso que algo estava se diluindo dentro de mim depois de toda aquela mixórdia desnecessária. Cresci orando e louvando a Deus e todos os homens santos e religiosos. Aprendi que a educação religiosa faz o homem ser desprovido de raiva, rancor ou ódio. Longe de qualquer sentimento ou satisfação da natureza mais baixa do ser humano. Mas aqueles olhos do santo padre Sólon e do ministro José Trasímaco denotaram estranheza para mim, havia algo naquelas duas almas que não estavam em harmonia com, e inclusive, o Livro Sagrado do Mosteiro.
A biblioteca era um salão enorme localizada ao fundo do mosteiro, longe de qualquer barulho. Perto da solitária eclesiástica. Era dividida em dois salões. Um bem maior do que o outro. O maior era a biblioteca dos estudantes, dos monges aprendizes, recebia também pessoas comuns que fossem cadastradas por instituições ou fundações beneficentes e de utilidade pública. Apesar de grande, havia muito livro repetido, perante a procura por livros antigos. Muitas Bíblias, livros sobre a vida de Buda, Santo Agostinho, Tomás de Aquino e os apóstolos Paulo, Lucas e João. Havia poucos, quase nenhum livro de literatura essencialmente. Perguntei à bibliotecária por tais livros, sobretudo alguns portugueses, Fernando e Eça. Ela me disse que havia alguns exemplares desses autores, mas que eram expressamente proibidos para os estudantes. Ficavam na sala menor da biblioteca, onde também estavam todos os clássicos literários, filosóficos, pedagógicos, enfim, tudo que fizesse pensar, só os padres, ministros do alto escalão da cúria tinham direito.
Sabia que todos os dias depois da ceia da noite. Café com leite e pão sem manteiga ou margarina, além de muita oração. O santo padre Sólon e os ministros da cúria ficavam na saleta da biblioteca lendo até 22, 22:30 no máximo. Havia deixado, pela manhã quando peguei emprestado um tomo do Livro Sagrado do Mosteiro, uma janela sem o trinco. Ela ficava ao canto perto do alojamento dos estudantes. Não ventava, portanto não haveria risco de abrir-se e bater. Às 23:15, pulei a janela do meu quarto que ficava no térreo e com uma dissimulação que até então não sabia que possuía, furtando as vistas de quem quer que seja, entrei na biblioteca pela janela descerrada propositalmente. Ao entrar na biblioteca dos santos padres, deparei-me de imediato com uma inscrição em cima da mesa de leitura. Dizia o seguinte: “ÓRACULO DE DELFOS – CONHECE-TE A TE MESMO”. Não me lembro de o Santo Ofício ter autorizado um selo com esses dizeres, na verdade nunca ouvi falar de Delfos. Enfim passei praticamente toda a noite escolhendo livros “proibidos”. Escolhia sempre os que havia mais de três ou quatro exemplares. Autores que só ouvia falar em algumas aulas do mosteiro ou que, há tempos, li um ou outro texto na escola convencional. Mesmo assim muito vigiado por minha mãe. Durante aquelas horas sentia meu batimento cardíaco aumentar. Enlevado e encantado por aquelas riquezas escondidas, oprimidas e controladas. Um desejo irreprimível tomava conta de mim ali dentro. Queria ver tudo, saber de tudo. Já em alta madrugada me preparava para sair e voltar para o meu quarto no alojamento. Consegui colocar na mochila que levara, trinta e oito livros. Todos clássicos de autores diversos. Contudo ao me dirigir à porta, passei por uma estante que continha alguns armários trancados. Vi os nomes do santo padre Sólon e dos ministros. Sólon e José Trasímaco estavam um ao lado do outro. Pensei em arrombá-los, mas logo demovi a idéia. Contudo aquela coceira curiosa clamava para que eu abrisse aqueles armários. Como se eu fosse descobrir algo importante sobre a vida. Deixei a mochila no chão e comecei a forçar os armários. Em dado instante, minha mão correu a mesa de leitura e em sua extremidade embaixo havia duas chaves penduradas num gancho parafusado na madeira. Na primeira tentativa o armário do ministro José Trasímaco abriu-se, havia documentos, papeis e livros. Muitos livros de Filosofia, Teologia e livros dele mesmo, pensamentos a respeito da vida. Havia também uma porta-foto trancada, nunca tinha visto um daqueles. A outra chave abriu o armário do santo padre Sólon. Também a mesma coisa. Documentos, papeis e livros. Havia um baú um pouco maior do que uma caixa de sapato, que presumi estaria também trancado. Fechei tudo e coloquei a chave no lugar, porém lembrei de um fato ocorrido na família de minha mãe. Minha tia-avó Eurídice possuía um baú parecido com aquele. Guardava a chave por dentro de suas roupas íntimas no corpo, todos ficavam intrigados com aquele enigma secreto e de natureza confessional que minha tia-avó guardava junto a si, colado ao corpo. Um dia, não se sabe como, a chave se desprendeu da anágua e caiu na porta do banheiro. Minha tia-avó e minha mãe sempre andaram juntas e dessa forma se comportavam da mesma maneira. Possuíam então muitos desafetos na família e em todo lugar. Um das primas, minha tia Cleide, rival e adversária da empáfia das duas, foi quem viu e recolheu a chave. Esperou e junto com mais quatro, também rivais, abriu o baú. Foi um chororô desesperado e convulsivo, descobriram que minha tia-avó Eurídice teve um caso amoroso com o primo George, fê-lo de Orfeu. Que por sua vez era irmão da prima rival, tia Cleide, que achara a chave do tal baú. Lá continha cartas amorosas e fotos comprometedoras. Toda a família soube. Lembro-me também de que minha mãe ficou horrorizada e numa cumplicidade, não sei porquê fora de hora, confraternizou-se com minha tia-avó. Com aquela lembrança voltei ao baú do santo padre Sólon. Para minha surpresa estava aberto, não havia cadeado. Abri e vi cartas do irmão dele mesmo, alguns livros marcados (Madame Bovary, O Crime do Padre Amaro, O Retrato de Doryan Gray, Fausto...), Ouvi falar do Crime do Padre e da tal Madame, os outros não... O Padre Amaro inclusive esteve em minhas mãos umas duas vezes, e nas duas vezes minha mãe arrebatou de mim. Não acredito que houvesse nada de errado com o Padre Amaro, ainda mais para cometer um crime... E, voltando ao baú, muitos papéis referentes à família do santo padre, nada demais. Ia fechando quando vi ao fundo embaixo de alguns papéis um colorido diferente. Puxei e vi uma perna, a foto de uma perna, vi que se tratava de uma revista. À proporção que puxava, a perna ia se desnudando e apareceu por completa nua. Parei e percebi que se tratava de uma perna de homem, puxei mais um pouco e percebi outra perna, que não era da mesma pessoa, por debaixo daquela primeira. Também perna de homem. Meu coração bateu mais forte e estupefato e incrédulo puxei a revista de vez. Talvez tenha sido o momento mais nojento da minha vida. Uma revista de sexo explícito e homossexual no baú do santo padre Sólon. Pior, estavam colados em cima dos rostos dos homens, que se inundavam de prazer mundano, recortados e colados os rostos do santo padre Sólon e do ministro José Trasímaco. Aquilo não era nenhuma brincadeira se não, não estaria no fundo do baú do santo padre Sólon. Fora ele mesmo quem fizera aquela imundície.
Voltei às minhas atividades normalmente. Quer dizer, aparentando normalidade. Não voltei a olhar o santo padre Sólon e o ministro Trasímaco nos olhos. Aliás, durante minhas leituras ocultas durante a noite, soube a origem do nome do ministro. E em face da descoberta indecente, obscena e imoral, percebi que nunca um nome caíra tão bem em uma pessoa quanto no ministro eclesiástico. O ministro anuiu injustamente com a minha punição para ratificar seu poder. Infelizmente não tenho Sócrates para refutá-lo. Sem saber ainda que medida tomar, confuso, tumultuado, hesitante e perplexo, sentia a chama dentro de mim se apagar. Por vezes depois da minha descoberta, flagrei a troca de olhares furtivos, acompanhado de sorrisos esquivos e pela primeira vez percebia o ar de patifaria e fingimento que derramava e alagava aquele lugar.
Cerca de três semanas depois a bibliotecária veio me chamar.
_Estudante! Estudante! O senhor está aí?
Indeciso, fiquei calado.
_Estudante! Tem uma pessoa na biblioteca querendo lhe falar...
Na verdade eram duas pessoas. Temeroso e apavorado atendi a bibliotecária que não soube, ou não quis me dar maiores informações sobre quem queria me ver. Certamente seriam o santo padre e o ministro. Por alguma razão tirei o hábito e fui vestido como um homem comum, que era na verdade como eu passei a me sentir naqueles dias. Não conseguia pensar em nada, em nenhuma desculpa, para o assalto daquela noite. Fui lívido e certo de uma punição maior ainda.
_Celeste? Tia Cleide? O que vocês estão fazendo aqui?
_Meu irmão! Meu irmão! Olhe só o que fizeram com você...
_O que?
_Tantas coisas, meu irmão, tantas coisas...
_Mas o que há?
Sem dúvida aqueles foram os piores dias da minha vida. Depois daquela visita de Celeste e de minha tia Cleide, prima de minha mãe, e dos acontecimentos dentro do mosteiro que só eu tinha conhecimento, tive a certeza de que, mesmo sem conhecer muito da vida, nada mais me abalaria. Comecei a perceber que o ser humano é tecido de inúmeros novelos. De infinitas cores e até da ausência de cor. E que tudo acontece a todos. As falas de minha irmã e de minha tia colocaram por terra e apagou de vez a chama da fé. Perdi trinta e três anos da minha vida...
_...então ele nos chamou, eu e nossa prima aqui, e confessou tudo, meu irmão... Lembra do baú da nossa tia-avó?
_Como poderia esquecer de baú?
_Pois aquele baú tinha mais coisas que no afã de desmascarar a tia-avó, a prima e as outras não perceberam...
_Perceberam o que, Celeste?
_Meu irmão, sinto muito ter que lhe dizer isso, mas você pagou, expiou os pecados de nossa mãe durante toda a sua vida...
_Explique de uma vez, Celeste...
Sem muitas palavras, demonstrando sobriedade e, acho eu, com um desvelo maior do que ela sempre possuiu, Celeste contou a real história do baú de minha tia-avó. As duas, não somente minha tia-avó Eurídice, mas também minha mãe, juntamente com o primo-tio George, o Orfeu da família, movidos pelo afã e pelo calor do desejo, os três tomaram a iniciativa de, somente entre eles três, ceder e vergar-se aos atributos sexuais da carne. Então o trio bacanal entregava-se freqüentemente a orgias idílicas do sexo pelo sexo. O que se sabe e que fora contado por ele mesmo antes de morrer é que as duas fizeram um pacto demoníaco voluptuoso em torno do desfrute do corpo dele, do primo George. Ele, por sua vez, não tinha nada a perder, sucumbiu às juras sexuais das duas. O detalhe é que na época minha mãe conheceu meu pai e, por isso e ao que tudo indica, ela freou mais seu apetite. Contudo tinha recaídas e num dia desses ao chegar de um encontro com meu pai, cheia de desejo e minando entre as pernas, entregou-se ao primo George. E foi assim que eu nasci. Desde então ela achava que eu era o castigo de toda a vergonha libidinosa. Projetou em mim a fraqueza que a consumiu e repetia sempre que todo aquele sacrifício que eu fazia, suprimindo minha juventude, banindo meus desejos de jovem e adolescente, era a caridade cristã. Celeste me disse ainda que nosso pai, ou o pai dela, jamais deveria saber daquilo. Até ela mesma, nossa mãe, não sabia que fora descoberta. O primo-tio George morreu e não se sabe se houvera mais casos como aquele em que eu fora o protagonista.
_Bibliotecária, onde está o Estudante?
_Não sei, senhor santo padre Sólon... Eu o vi ontem ali conversando com duas moças... Numa atitude suspeita, santo padre, havia uma que o agarrava e o beijava num frêmito intenso... Será que o Estudante desistiu do hábito, santo padre?
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_O que houve para você perder tanto tempo, querido? Aliás, para quem era donzelo você sabe muita coisa...
_Aprendi nas revistas...
_Muito bem! Apesar de ter gostado de você, esse é meu trabalho... Cem reais...
_Não vá agora, Marcele! Fique comigo e cuidemos um do outro...

Carlos Vilarinho 2/08/2006


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