sábado, 1 de março de 2008

CHEIRO DAS ENTRANHAS


Suzana passava desodorante nas axilas quando olhei para ela. As dobras e a concavidade do sovaco mexeram imediatamente com a minha libido. Aquela concha embaixo dos braços de Suzana assemelhava-se fortemente com sua vagina. Havia, é claro, uma diferença geométrica, mas a atmosfera que aquela imagem produzia me deixou em êxtase duro e teso. Pensei em outros sovacos que conheci. Ela desconfiou do meu pensamento inusitado.
_Conheço essa cara, o que está pensando?
Não disse a Suzana a minha paráfrase sexual. Uma metáfora incomum que aparece do nada quando achamos que estamos distraídos. A vida para Suzana quebrava-se insistentemente como os tubos das ondas surfistas. Ao contrário do que muitos achavam, Suzana era uma mulher cheia de pudores convencionais que só os esquecia quando o outro conseguia penetrar-lhe vagina adentro e soluçar dentro dela. Não era pra frente, liberal, Woodstock ou coisas do gênero. Era, no entanto bela, de pele morena e cenho franzido. Acho que ela mesma enxergava-se feminista, e ela própria sabia que não era. Não sei de imediato ou deliberadamente o que chamou a atenção para o sovaco de Suzana. Só sei que as dobras e os pêlos por raspar levaram-me de imediato ao sexo dela. Às vezes quando terminávamos de fazer amor, Suzana dizia que eu era porco. O lençol ficava melado e eu me espojava por cima do melaço. Eu ria e falava uma verdade disfarçada de brincadeira.
_Você não mexe direito, por isso mela tudo...
E surtia efeito, ela ficava na dúvida. Não sabia se eu falava a verdade ou se estava brincando. Ria sem graça e se levantava para buscar cervejas e cigarros. Além de pudica, era meio indolente, sobretudo depois dos soluços dentro dela. Tinha um sinal no seio esquerdo, outro na virilha, às vezes, quando não fazia os pêlos, o sinal ficava escondido na mata dos países baixos, assim eu mesmo brincava com ela, e gostava sempre de escova no cabelo. Não sei se era esquecida de propósito, tem mulheres que gostam de ser avoadas. Ou se realmente tinha rixa com o tempo. Parado ainda gozando o gozo, depois dos soluços dentro dela, lembrei-me de Teresa Cristina. Essa era diferente, não tinha nojo das gotas do amor. Era, entretanto muito contida e discreta no social. Nunca se atrasou, e não esperava soluçar no seu interior para esquecer do mundo fora das paredes. Entretanto jamais senti algo diferente quando me deparei com o sovaco de Teresa Cristina. Mesmo não tendo a memória ativa para as axilas de Teresa, acho que o sovaco dela não tinha dobras. Era liso e branquinho. O sexo dela também era liso com uma tênue cor lilás no início das bordas labiais. Pensei em falar isso para Suzana, para ver e sentir a reação dela. No entanto contentei-me em comentar com furtiva sinceridade que havia por inteiro em seu corpo e ao redor dele quando os membros se unem uma sexualidade diferente. Suzana me olhou mais desconfiada do que a primeira vez e aí percebi sua insegurança com relação a mim e a ela própria. Se fosse Teresa Cristina teria agarrado meu falo e sugado o que ainda restava do meu leite. Pedi a Suzana para não se vestir. Senti que quase a encabulava, mas dei-lhe um carinho rude e impetuoso que a fiz esquecer o acanhamento. Pus seu braço esquerdo estirado para ao mesmo tempo repousar a cabeça dela e eu olhar a extensão e contornos do sulco que compunham o sovaco de Suzana. Comecei a fitá-lo em discreta visão. Olhava o rosto de Suzana, seus traços e olhos puxados. Com a escova do cabelo já assanhada e com outra visão, a de través, pus-me a desejar a axila com cheiro de creme da minha parceira de sexo. Olha-se para um lugar e fita-se outro. Delineei então toda axila da morena Suzana. E ficava cada vez maior a minha ereção. Pensei ao mesmo tempo na boca de Teresa Cristina lambendo meu pau e no corpo rijo de Suzana em letargia latente depois do gozo.
_Você é estupidamente grande...
Quando achava de beber, bebia conhaque e ficava bêbado na terceira dose. Vomitava logo. Suzana então me levava para a privada, depois de ter golfado uma ou duas vezes. Aí sentia o cheiro do sovaco. Mas não tinha o cheiro que queria sentir. Gostaria de sentir o cheiro das entranhas de Suzana no seu sovaco. O cheiro salgado de dentro da mulher. Ficava entediado com a companhia meio intelectual de Suzana. Ela começava a falar de Simone de Beauvoir. Eu fingia não entender bulhufas. Não gosto de feministas e odeio papo cabeça de gente que não conhece porra nenhuma. Conhece nada de viver, por exemplo. Já havia dito isso a ela. Conversa, conversa e conversa, depois morre, sem fazer, nem transformar nada, nem ninguém. Uma vez Suzana me apresentou a uma criatura com um sovaco horroroso. Falava de educação e de coisas espirituais. Fiquei tão entediado que fui fumar maconha com os adolescentes, voltei muito doido e falei sobre vaginas. Todos me ouviram fingindo normalidade. Percebi, entretanto um ranço careta e moralista sobrevoando a atmosfera. Então me calei encabulado. Talvez fosse a maconha, mas acho que não. Suzana não era assim intelectualizada com tamanha intensidade como queria mostrar ali naquele momento de sexo. Comecei a ouvir a ladainha filosófica que se dispôs a falar. Falava para disfarçar o pudor que a tomava. Eu viajava no sovaco de Suzana, ela nem desconfiava disso. Falava mais coisas intelectuais. Depois falou de cultura e sociologia. Disse-me que eu deveria cuidar da minha cabeça e fazer poemas mais engajados.
_Mas Suzana a poesia de engajamento já saiu de moda...
Ela aproveitou e disse que se eu fosse realmente poeta eu tinha que ter dentro de mim uma vontade de explodir o mundo. Acho que fiz uma cara daquelas de desfaçatez bem acentuada. Suzana muxoxou e levantou-se novamente. Estava visivelmente acanhada e com pudor do belo corpo que possuía. Mas eu só queria continuar a olhar o sovaco dela. Pensei em dizer-lhe isso, mas ela não entenderia. Mudei de assunto o mais rápido possível e fiz-lhe novamente um carinho rude. Peguei-lhe pelo sovaco e fiquei roçando meu braço embaixo das axilas dela. Um dia Teresa Cristina falou dos meus pés. Comparou meu pé com meu pau. Uma estranheza enigmática quase me tomou nesse dia. Depois pus a olhá-lo e dobrei a perna até a virilha e tentei medir os dois para ver qual era maior. Meu pé era um pouco maior. Enfiei o pé na vagina de Teresa Cristina. Mas o que queria mesmo era penetrar no sovaco de Suzana. Ela sem desconfiar do meu real objetivo deixou que eu brincasse com o seu corpo. Meti meu rosto no sovaco e fiquei cheirando, lambendo, beijando, mordendo. De repente no êxtase, assaltou-me um pensamento que andou dentro de mim por instantes. Será que a minha tara sovacal era um fato social? E se de repente o mundo inteiro aderisse ao sexo de axilas? Mas nenhuma axila era como a de Suzana. Uma vez estudava Letras numa faculdade mambembe. Só fazia então olhar e observar os colegas. Apesar de estudantes de Letras tinham leitura limitada ao curso somente. Eu tentava me firmar como poeta. Conheci dezenas de garotas lá. Mas uma destacou-se em meu eu. Era despojada, tinha um cenho franzido e usava saia rodada. Parecia uma cigana. Zafira era o nome dela. Ela, Zafira, era dona de uma autenticidade ímpar, apesar de muito nova. Às vezes, quando eu falava asneiras intelectuais de propósito, ela era a única que perguntava: O que é isso? Quando eu sabia, dizia. Quando inventava, inventava também a resposta. Era jovem e solteiro e não havia em mim ainda a tara axilal. Acho que tudo começou naquele dia. Zafira passou e um vento levantou o saião. Aquilo foi um presente dos deuses. Vi a calcinha pequenina. Não sei o que se passou na cabecinha dela que não largou os livros presos embaixo do braço, no sovaco. Veio ofegante para o meu lado e sentou-se sem graça. Tão desconcertada que vi o seio, grande, rosado e duro pular da blusa. Eu que lhe avisei. No entanto o que me chamou a atenção realmente foram as dobras da junção do braço e do ombro descendo para o sovaco. A minha imaginação de poeta brilhou entre as dobras do braço e o seio rosado. Achei que a vagina de Zafira era daquela forma. Pedi a ela, com a cara mais deslavada para que me mostrasse. Ela riu. Ruborizou-se. E pediu para que eu a acompanhasse. Fomos para uma sala no último andar. Zafira sentou-se numa mesa de professor e suspendeu o saião, tirou a calcinha pequenina e me mostrou o sexo com os pêlos aparadinhos protegendo ao redor dos lábios a entrada vaginal. Lambi até ficar viscoso. Senti o cheiro das entranhas, que procurava em toda mulher que possuía e poucas tinham. Elas preferem o cheiro do creme laboratorial. Em cima e embaixo. Pensei em fazer um movimento masculino, uma greve, uma passeata, pela volta do cheiro das entranhas femininas. Voltei do sonho com a sacudidela de Suzana. Havia cochilado embaixo do sovaco dela.
_Quanto tempo eu dormi?
_Não sei, uma hora, mais ou menos.
_E você ficou assim todo esse tempo?
_Fiquei... Fiquei com peninha de você.
Tive orgulho de Suzana. Ela gostava de mim, dava provas de suporte amoroso. E eu cá nos meus pensamentos e sonhos prostitutos. Na verdade não sei até que ponto vale a pena amar o sexo oposto. Vale a pena fazer amor, conversar, beber, comer e depois ir embora cada um para sua casa. Eu mesmo iria procurar futebol na televisão, beber cerveja e babar todo o sofá quando cochilasse. Acho que não babei o sovaco de Suzana. Aliás, dava graças a deus por ela não ser adepta da ladainha de “amor vamos fazer um filho?”. Nem todas as mulheres são filhas de Yemanjá. A maioria delas traz uma Padilha de frente. Quem escolhe o que quer ou quem quer é a mulher e quem come são elas. Ditadura vaginal desde os primeiros tempos. Ouço diariamente em todos os lugares que vou e fico a abelhudar o universo feminino que todas gostam do cheiro de homem. Cheiro de sovaco de homem. Numa coisa elas têm razão, o cheiro das entranhas é estimulante sexual. Contudo são paradoxais e elas próprias enchem-se de perfume. Suzana não é diferente. Teresa Cristina era diferente, às vezes não sentia cheiro de nada que exalasse dela. Teresa Cristina casou-se com um vendedor de automóveis que ganhava três vezes mais do que eu. Tive vontade de mostrar-lhe as poesias que fizera pensando nela. Mas não ia adiantar, poesia não mata fome nem dá status social. Além de que todo poeta é zonzo e prefere girar o mundo atrás de metáforas a buscar alicerce financeiro para sentir-se poderoso. Teresa Cristina era prática dentro e fora de quatro paredes. Suzana agora me olhava com olhos pidões de beijos.
_Quer casar comigo e ter filhos?
_Tá maluco? E o meu noivo?
_Se gostasse dele não estaria aqui nua e me pedindo beijos.
_Não estou lhe pedindo beijos.
_Está me pedindo por dentro sem deixar sair.
_Mas que conversa! Não quero casar com você...
Era isso que queria ouvir. Fiquei mais tranqüilo, mesmo percebendo o embaraço que a tomou inadvertidamente. Ela queria, sim. Mas não acreditava que estivesse falando a verdade. Não estava mesmo. Suzana começou a vestir-se. Deixei, queria ficar só. Ela saiu sem falar comigo. Uma onda de solidão me invadiu. O cheiro do creme de Suzana ficou no ar. Cheirei meu próprio sovaco e pus-me a escrever poemas de cheiro...
Carlos Vilarinho 01/03/08

Um comentário:

Letícia Losekann Coelho disse...

Vilarinho,
adorei!! Interessante a visão sobre uma parte do corpo que "normalmente" não nos deixa com "tesão"! Gostei demais desse conto, diferente e apaixonado, pq não?
beijos meus