segunda-feira, 30 de junho de 2008

O MICROFONE PRATEADO

Andrade, Adílio e Zico. Tita, Nunes e Lico.
Havia a princípio uma aliteração no meio-campo orquestrado. Em seguida uma rima sinuosa. Aquelas seis palavras provocavam ao mesmo tempo pavor e prazer. Pavor para cruz de malta, ou para a estrela solitária. Pavor também para o pó-de-arroz fantasmagórico que no início do século tentava maquiar a virtude negra de lidar com o balão de couro. Estava aos poucos me acomodando no Rio de Janeiro. Domingo entraria pela primeira vez no templo gigante do futebol, o estádio Mário Filho, o Maracanã. Migrava do nordeste para ser jornalista e cobrir a copa do mundo. Para ser jornalista e ver de perto, lá dentro dos gramados, o Flamengo ser campeão novamente. Sentir aquela alegria Alexandrina dentro do futebol. Cheia de ritmo, verso e prosa, como Armando Nogueira me fazia ler todos os dias na resenha da gazeta. Contudo todo meu encantamento por pouco não se esvaece por causa da ousadia azurra que arrancou lágrimas de sangue do meu sonho adolescente de ser tetra-campeão do mundo. O estádio Sarriá em Sevilha sucumbiu a Paolo Rossi, na época, o mafioso do calcio. Naquele dia me senti um troiano sendo invadido por um cavalo que eu subestimei, julguei sem pejo ou acanhamento, muito senhor de mim, ou do meu escrete canarinho...
_Arriverdérci, Brasile!
Depois daquele dia decidi cobrir esportes náuticos quando jornalista. A tragédia romana que sobreveio na Espanha em oitenta e dois provocou ecos ensurdecedores em mim. Foi uma decepção. Não quis mais jogar bola nos becos do Vidigal, nem saber quanto estava o Fla-Flu de oitenta e quatro, vencido pelo Pó- de-arroz de Nelson Rodrigues e Mário Lago.
Com o passar do tempo, privilegiado em olhar as formas femininas que desfilavam no Arpoador, tentei ser surfista. Comprei prancha de duas quilhas, então novidade na época, parafina e elastique. Mas Yemanjá zombava de mim, derrubava-me e todos os dias saía da água salgado por fora e por dentro. Um dia ao voltar para casa, o Rubão, zagueiro do time do Vidigal, o mais velho da turma, gritou meu nome.
_Roberto! Ô Roberto! Vem cá, rapaz.
_O que houve, Rubão?
_O que houve? Ora! Nunca mais apareceu para a pelada.
_Não quero mais saber de futebol... Serei jornalista de esportes náuticos...
_E por isso toma caldos todos os dias... Vai desidratar, moleque! Deixa de bobagem rapaz! Há tempos está assim por que perdeu uma copa! Imagine em cinqüenta, aqui, em baixo dos nossos narizes, tomar dois a um de virada...
_Também! Ouvi falar que o goleiro era do Vasco!
_Meu pai me disse que era sim, mas e daí? Daqui uns dias a gente ganha nos pênaltis ou com gol de mão... Vai servir para você?
_Lógico eu quero é ganhar a copa...
E Rubão aos poucos me trouxe novamente para a lateral direita do time do Vidigal. Queria ser igual a Leandro, cruzar na cabeça. E sair para abraçar o centroavante.
Então lá estava eu, cobrindo não Zico ou Falcão, mas Romário e Bebeto. Jorginho cruzando e Branco fazendo gol espírita. Na final eu estava atrás do gol dos pênaltis. Por instantes a imagem de Paolo Rossi veio em minha mente. Vi meu rosto banhado de lágrimas. Mas desta vez eu tinha que fazer algo. E fiz. Notei que havia algo errado quando os jogadores iam bater o pênalti. Primeiro foi com o Romário, o baixinho colocou as mãos na testa como se algo o incomodasse, e quase que ele perde. Márcio Santos jogou por cima, ali eu tremi. Depois foi Baresi, Taffarel pegou com relativa facilidade. Pois eu descobri o que havia de errado na hora da cobrança do pênalty e fomos tetra-campeões graças a mim. Quando Roberto Baggio ajeitou a bola, fiquei atrás do Taffarel ao lado direito da trave. Nesse momento calculei o raio solar e ergui meu microfone prateado, o lado mais brilhante para o sol. Deixei brilhar na marca do pênalti. Quando o carcamano correu fiz um movimento brusco com o braço, o brilho que refletia do meu microfone atingiu diretamente a altura do olho. E o bambino chutou nas nuvens. Ajoelhei sem acreditar. Éramos tetra-campeões do mundo com a minha vingança. Chorei muito de felicidade e ria da cara de Baggio que me olhava incrédulo...

Carlos Vilarinho 13/05/2006

domingo, 22 de junho de 2008

VINTE E CINCO CARNEIROS de Heitor Brasileiro Filho-final

Vítor, contendo o sorriso maroto, o aguardava na cabina com o recibo de vinte e cinco carneiros na mão. O guarda Macário, em cólera, tremia ao segurar o papel. Brioso saltou sobre a carroceria espantando os carneiros e usou todos os dedos ao refazer a conferência.

- Vinte e cinco! Sentenciou o guarda Macário para Brioso.
- Oxén... Aí, tá certo! Vinte e cinco. Confirmou Brioso, minutos depois.

Macário tem os olhos injetados quando se volta para Vítor.

- O senhor num parou onte de noite...
- Não quis despertar o sono de vossa excelência. Desdenhara Vítor.
- Da próxima vez atiro no cachaço, só pra ver a queda.

Os olhos se cruzam demoradamente. Até que o olhar do guarda Macário pousa sobre a carapinha de Tião. Tião finge que não é com ele.
A corrente afrouxa, desce devagar até ficar completamente mole. Os pneus esmagam os gomos da corrente e sobre ela paira uma insolente nuvem de poeira.
Entre o guarda Macário e o guarda Lucena ainda não se dissipou de todo uma nuvem de ressentimento. Brioso sabia que mais cedo ou mais tarde haveria de ter uma reparação. Macário, humilhado, custava acreditar que eram apenas vinte e cinco carneiros. Os curiosos se afastaram lentamente, em meio ao burburinho. Estavam desapontados, esperavam algo espetacular. Algo forte. Algo que os libertassem do tédio naquela morna manhã de inverno. Macário, ainda relutante, esperava o momento certo, ou menos vexatório, para pedir desculpas ao guarda Lucena. Até que explodiu, inconformado.

- Vôte! Invurtô? V-i-n-t-e e c-i-n-c-o carneiros!
Lucena, resoluto, inquiriu.
- E dadonde tá usotro, no fi-o-fó de vossa progenitora?

O guarda Macário espoletava uma resposta de calibre quando foi interrompido por Zezito da Rural. Esbaforido, Zezito chegou da Palmeirinha, um distrito próximo dali. Tinha pressa de levar uma paciente picada de Jararacuçu, cobra de letal veneno, para o Hospital Regional Vincentina Goulart. Zezito da Rural, além de seus préstimos como hábil chauffer de praça, também era conhecido pela língua viperina. E foi logo interrompendo.

- É de carnero, que vocês tão falano? Agora mermo eu vi uns carnero passano de canoa lá na Sete Porta...

O guarda Macário não esperou o final do relato. Olhou com um ódio mortal para a indefesa bicicleta e marcou-a para sempre com brilho e a fúria do seu sapato vulcabras.

Heitor Brasileiro Filho

sexta-feira, 20 de junho de 2008

VINTE E CINCO CARNEIROS de Heitor Brasileiro Filho

Há uma semana sem ver os meninos e sua Carolina que o esperavam em Senhor do Bonfim, destino da carga de carneiros. Os carneiros foram comprados com o que restou do frete dos cereais, naquele fim de mundo não havia carga de volta. Então trouxe os carneiros. Assim voltava mais cedo sem vir rodando o caminhão vazio. Tinha a chance de matar a saudade da família e de engordar o frete. Mas antes teria de negociar com os fiscais em Jacobina e passar pelas correntes. Havia chegado à primeira barreira. A temível pança do guarda Macário. Mas não era a única. Teria que passar por outra barreira ao sair da cidade. Mas ainda não sabia como vencer a próxima corrente. A corrente do guarda Lucena.
Tião subiu no estribo do caminhão, Vítor engatou a marcha e seguiu devagar. O guarda Macário roncava ao lado da sua bicicleta e um vistoso cano de revólver pendia na cartucheira de couro envelhecido. O quepe oscilava entre o nariz e a sobrancelha em obediência a lei da gravidade. Ao ver Tião comprimido no banco do carro, Vítor sorriu e se despediu do guanda com uma solene continência. Já havia engrenado a quarta marcha quando finalmente ouviu o maldito apito. Em seguida, o estampido. O guarda Macário havia despertado das profundezas do sono e atirado para cima, numa tentativa frustrada de deter o caminhão. Vítor sorria, mas conhecia os caprichos do guarda. Sabia que seria seguido implacavelmente nas ruelas de centenários paralelepípedos por fúria, pança e bicicleta.
O caminhão com os carneiros evitava as ruas principais, Vítor conhecia como ninguém aquelas ruas e acelerava para alcançar a São Salvador. De lá seguiu pela Rua da Conceição, atravessou a pequena Ponte do Convento em direção a Rua da Estrela. Esgueirando-se por pequenas ruas periféricas poderia alcançar com êxito, e sem ser identificado, a Rua da Bananeira. Após o pontilhão de aço, conhecia um caminho de terra paralelo à rodovia que iria dar nas Sete Portas. Local onde poderia desembarcar vinte carneiros com segurança até o dia seguinte. A Sete Portas nada mais era que uma casa antiga com exatas sete portas. Em outro tempo talvez tenha servido de pouso de tropeiro, ou armazém de secos & molhados para atender aos garimpeiros de ouro. Ficou abandonada do outro lado do rio, próxima à cabana do canoeiro Manezinho. Os meninos areieiros contavam pra todo mundo que a Sete Portas era mal assombrada.
O Rio Itapicuru-Mirim separa a rodovia e a estradinha que passa diante da Sete Portas. Em tempos de chuva nenhum carro se atreve a passar no rio. Nas Sete Portas a carga excedente ficou sobre a guarda do compadre Manezinho, que o recebeu com a satisfação de sempre. Vítor manobrou o caminhão de volta, em direção ao centro de Jacobina, e aliviado estacionou adiante do quintal de Glorinha, uma alameda de cumplicidade e discrição. E distendeu os músculos - Ah, Glorinha... Pouso tranqüilo, bebida generosa e xodó sem compromisso. Logo depois Tião voltou pra boléia, tranqüilo, com um sono de vinte e cinco carneiros.
Ao amanhecer, Vítor saiu da casa de Glorinha já sabendo o que iria encontrar pela frente. Um posto de fiscalização em alvoroço. O guarda Macário em cólera, com os olhos injetados de sangue, espumando nos cantos da boca e cuspindo na cara dos interrogados.

- Boleiros!
- São todos uns boleiros! Vociferava inconformado.
- Se deixou passar os bichos, então por que não guardou o meu?

O guarda Macário, na sua fúria, foi além das conveniências. Sequer percebeu que havia tocado nos brios do guarda Lucena. Mais conhecido como Brioso, Lucena sempre que tomava umas jurubebas a mais não agüentava desaforo, ficava valente. Lucena (ou Brioso) só sentia remorso quando lembrava da prima que tirou de casa e largou de barriga aos quatorze anos em Mossoró. Saiu jurado do Norte. Daí então cumpria ser homem sério. Virou fiscal por ordem do Coronel Chico Rocha. Somente ao Coronel devia serventia. Há vinte e três anos é casado com Jurema, cabocla da terra, já têm filhos no ginásio. Não podia admitir os impropérios do guarda Macário. Esperou juntar mais uma meia dúzia de curiosos e devolveu a provocação.
- Já disse e afirmo, num passou nenhum caminhão de bicho. Meu conseio é mudar o rumo dessa conversa, mode acordei cum dedo coçano... P'a pocar uma bala no meio dos chifre de um fi-duma-égua abasta um cisco.
O guarda Macário, sem tirar os olhos gordos de Brioso, apalpou o cabo de madeira do Taurus 38, cano longo, e o fulminou com um olhar raivoso e correspondido. Os precavidos já tinham tomado posição pra ver o espetáculo com segurança. O guarda Macário então deu um pinote e apontou com o dedo em riste na direção do caminhão enlameado que acabara de estacionar diante da corrente esticada.

- É... É esse. O cabra!

Final domingo - 22/06

quarta-feira, 18 de junho de 2008

APRESENTAÇÃO

Heitor e eu fomos colegas na Universidade Federal da Bahia, lá pelos idos anos oitenta. Nova Constituição e eleições diretas-já. Brizola, Collor e Lula. Nossa geração foi marcada pela transição de poder, no entanto, o medo e a desconfiança ainda continuavam na atmosfera nacional. Estávamos acostumados a Caetano, Chico, Gilberto Gil, Raul, Camisa, entre tantos... Estudamos Rennee Welleck e Gil Vicente juntos. Eu, Heitor, Nélio Rosa, Patrícia Simões, Nailton, Alberto Ghiga, Narlan Matos, Elsa Coelho... Todos amantes da literatura, cheios de idéias. Idéias paradoxais entre nós, antíteses. Todos contaminados pela peste LIBERDADE. Citei os que ainda continuam trabalhando inseridos na literatura, que eu saiba. Heitor sempre muito verdadeiro e ácido. Ouvia para desconfiar sempre. Dessa forma apresento-lhe "VINTE E CINCO CARNEIROS" conto premiado no concurso BAHIA DE TODAS AS LETRAS 2007 junto com "O OGRO QUIROMANÍACO" de minha autoria. Foi com muita satisfação e mil lembranças que vi o nome de Heitor entre os premiados. Senti que não estava sozinho.
Valeu, HEITOR!

Carlos Vilarinho 18/06

VINTE E CINCO CARNEIROS - de Heitor Brasileiro Filho

Os faróis do antigo chevrolet iluminaram a corrente de ferro. A corrente esticada de um lado a outro da rua marcava a fronteira entre o possível e o impossível. Além de regular o trânsito de passageiros e mercadorias. Ninguém passava impune aos olhos do guarda Macário e sua incorruptível autoridade de fiscal fazendário. Coletor de impostos. Macário era o Guarda da Corrente. Um nome conhecido. Não apenas naquela cidadezinha encravada a noroeste na chapada diamantina da Bahia. Mas entre os transeuntes do lugar seu nome em algum momento fora mencionado. Para roceiros, feirantes, carroceiros e principalmente os caminhoneiros que transitavam por aquele sertão ornado de serras, tabuleiros e caatingas, Macário era um nome temido, mais pelo gênio irascível - ou bruto, como se diz por ali - do que pela autoridade de fiscal.
Vítor estacionou seu caminhão diante da corrente. Não escondia o cansaço. Era madrugada e chovia devagar. Trazia uma carga de carneiros no seu caminhão chevrolet, ano 1964, com algumas prestações a pagar. Foi o que sobrou da sua Bomba de Gasolina que pegou fogo. Vítor tentava não lembrar, mas teve um Posto de Combustível com bar, lanchonete e casa de autopeças. Virou cinzas. Descuido de um bêbado. Cochilou tentando acender uma bituca de cigarro. O fogo consumiu em horas o sonho de uma vida. O homem em chamas foi salvo por um cobertor úmido. Enquanto o sonho ardia. Os amigos sumiram. Sobraram as dívidas e a metade de um caminhão. A outra metade é paga através de Letras, Títulos de Crédito como dizem a moça sorridente e o garoto engomado por trás do balcão. O gerente do Banco, babando um gordo charuto, chamava-as Notas Promissórias. O chauffer assinou os papéis e traçou as léguas de promissão. O fato é que Vítor recusou ajuda do pai, pecuarista, que o queria fazendeiro. Jurou para si que venceria sozinho. Sequer foi cobrar aos falsos amigos o fiado do combustível, das peças de reposição e da farra cotidiana. Restaram cinzas. Agora estava ali, diante da corrente sob uma fina chuva esperando o apito do guarda Macário para poder avançar. O apito custava a soar. Seus ombros doíam. Os olhos ardiam. O guarda não se levantava. Sacudiu o ombro de Tião, ajudante e companheiro de viagens que roncava ao lado. Entregou ao Tião a nota que declarava compra de vinte e cinco carneiros dos quarenta e cinco que se encolhiam sobre o caminhão. Tião retornou, ainda sonolento.

- O guarda tá é durmino!

Vítor acionou o limpador do pára-brisa, mas a distância o impedia de ver algo além da neblina.

- Abaixa a corrente. Ordenou Vítor.

Tião arregalou os olhos, mas obedeceu sem titubear. Sabia da determinação do parceiro. Conhecia como ninguém o efeito dessas frases curtas. O prosador de causos hilariantes na boléia ou na roda de caminhoneiros sob estresse era monossilábico e fulminante. Estava no limite de suas forças. Enfrentou o perigo, lama, fome, frio e a solidão nessas estradas infames. Havia saído há uma semana e se embrenhado no sertão para levar uma carga de cereais na cidade de Lençóis. Subiu vagarosamente a Serra do Tombador margeando o abismo com os pneus deslizando em pedras soltas. O temível despenhadeiro impunha respeito. A paisagem deslumbrante do grande cânion também provocava calafrios. Do lado esquerdo, uma imensa parede de pedras sobrepostas ostentando acima da cabeça uma marquise natural que escondia o céu. No meio, a estradinha antiga de pedras soltas que o caminhão vencia como um lagarto vagaroso e obstinado. Na margem direita, a imensidão. Era o abismo. Sob aquele imenso vale florido havia um sem número de almas abraçadas com as ferragens e a vegetação. Almas antigas. Muitos companheiros de estrada havia se perdido por ali, e agora dormiam para sempre o sono dos descuidados, bêbados, dos traídos pelo cansaço. Um sentimento de admiração e melancolia envolvia o coração de Vítor sempre que passava naquele trecho da Serra do Tombador.

Continuação de "VINTE E CINCO CARNEIROS" e "SEGREDOS E MEMÓRIAS DE UMA MULHER ATRAENTE E DESPUDORADA" Sábado 21/06

terça-feira, 10 de junho de 2008

SEGREDOS E MEMÓRIAS DE UMA MULHER ATRAENTE E DESPUDORADA-sétima parte


Texto do livro"AS SETE FACES DE SEVERINA CAOLHA & OUTRAS HISTÓRIAS"
Meu quarto era o único que possuía duas janelas. Era no canto formando um ângulo de noventa graus. Uma janela via-se o Farol da Barra e a outra, numa parede angular via-se o forte São Marcelo. Uma maravilha de vista. Acho que aí começaram os bons tempos. Comecei a lecionar numa escola perto de onde morava. Não ganhava muito, mas era bem melhor do que se ganha hoje em sala de aula. Sempre tinha lembranças e memórias de Júlio e Luciano. Um frisson subia entre as pernas e ficava toda arrepiada. Num dia de sábado, em folga da docência, contemplava a baía de Todos os Santos. Queria esperar o pôr do sol. Havia ao fundo do sobrado da pensão onde morava uma queda d’água. Acho que nem existe mais, na época já estava enfraquecendo, mas ainda assim caía água. Era um lugar ermo, bem escondido, mas do meu quarto notava-se bem a clareira que era o lugar. Só reparei porque vi o Miguel, filho de criação dos donos da pensão. Ele estava nu, banhando-se. Fiquei na dúvida depois tive certeza, era ele mesmo. Rapaz novo, contava em seus dezesseis anos. Alto e forte, aparentava mais idade até. Não o via com freqüência na casa. Estudava e trabalhava. Era balconista de uma mercearia na Barroquinha. Passada uma semana da visão que tive, voltei à janela no mesmo horário. Lá estava ele novamente nu e banhando-se. Fiquei a observá-lo durante o tempo todo do banho. Senti um gozo distante ao observar outro alguém. O bico do meu peito ficou eriçado e subiu uma quentura pelas pernas. Ele nem desconfiava que estava sendo olhado. Esfregava-se, banhava-se e secava-se ao vento. Nesse dia sentei ao lado dele no almoça, ele me olhou e sorriso docemente. Percebi que era muito obediente aos pais e provavelmente ainda virgem. Almoçamos juntos e trocamos algumas palavras furtivas. Acho que os donos da pensão não queriam que se conversasse com os de casa. Mesmo assim trocamos algumas palavras que não lembro exatamente, mas o rapaz foi muito gentil e educado. Num dia da semana fui sozinha atrás do sobrado com a desculpa de procurar ervas para fazer chá. Colhi Kyôyô e Maria-preta. Molhei os pés na queda d’água, uma delícia. À noite jantei novamente junto dele. Procurei os seus olhos mas ele baixava as vistas.A imagem dele veio com ímpeto à minha memória e trouxe-a para o meu pensamento e minhas fantasias. Lembrei de Júlio e Luciano. Fiquei quente, parecia febril. Subi quase correndo ao meu quarto e percebi que estava molhada e num desejo voluptuoso forte. Comecei a me tocar com os dedos. Pensei em Luciano me comendo por trás, depois Júlio me chupando. Em seguida Miguel invadiu meus sonhos e com as mãos grossas e calosas arrebatou meu sexo. Gozei comigo mesmo naquele dia. Desde então passei a espioná-lo e me masturbar. Um dia ele quase flagrou meu vouyerismo. Ficou sem graça, apanhou as roupas e saiu rapidamente do local. Apressei-me em explicar que havia caído da cama e cheguei à janela procurando por alguém, pois o lastro tinha quebrado. Ele subiu examinou a cama e constatou que estava tudo em ordem. Novamente inventei que fora um sonho. Depois disso começamos a nos olhar furtivamente e aos poucos conquistei a confiança de Miguel.Ele então começou a me olhar nos olhos e quando eu não o tinha sob as minhas vistas, eu disfarçava, claro, ele me olhava por inteira. Fotografando meu corpo.Um dia durante o almoço sentei em outra mesa, fingindo que não tinha o visto. Na mesa bem em frente da dele. Levantei um pouco mais a saia e deixei as coxas à mostra. Ele ficou olhando para debaixo da mesa, quando levantou as vistas e me olhou, dei um sorriso e abri mais as pernas...

Oitava parte sábado 14/06

quinta-feira, 5 de junho de 2008

SEGREDOS E MEMÓRIAS DE UMA MULHER ATRAENTE E DESPUDORADA



Texto do livro -AS SETE FACES DE SEVERINA CAOLHA & OUTRA HISTÓRIAS (sexta parte)

Lá entrei em contato com a natureza bela e romântica da época. O Rio de Janeiro era realmente belo e nada do que ocorre hoje em nossos dias se passavam naquele tempo. Fui morar e fazer companhia à minha tia Luísa, casada com o engenheiro Carlos Torres... (recorda lembranças e suspira em uma pausa). Voltei a estudar. Freqüentei um grupo de Literatura, era a época do Modernismo. Devorava as obras literárias e aos poucos intensificava idéias e pensamentos a respeito da performance criativa. Foi quando surgiu Sartre e Simone Beauvoir. A França sempre produziu arte em demasia. Havia saraus e encontros literários. (pensativa) Hoje nada disso existe, a literatura foi relegada, as pessoas não querem mais ler, pois é difícil e demorada. Não sabem que essa demora é o tempo da sabedora que se absorve num texto literário. Ou em outros textos. O importante é fazer leituras e depois leituras de mundo. Será que não comporta uma interpretação de uma obra literária em sua essência, juntamente com o seu autor, nos dias de agora, filha? (respondi negativamente balançando a cabeça). Uma pena, os escritores teriam muito a acrescentar nas cabeças. Não que se direcionasse pensamentos ou idéias, mas que incomodasse, bulisse, advertisse os jovens. Acho que isso é necessário. Mas como ia dizendo, minha tia Luísa e o marido Carlos tinham um filho. O Luciano. Rio de Janeiro é a vitrine do Brasil para o mundo e talvez tivessem sido os melhores anos da minha vida. Me envolvi de cara com meu primo. Logo no primeiro dia trocamos olhares curiosos. No segundo já sorríamos um para o outro. Sorriso tendenciosos e cheios de languidez. No quinto dia, meus tios foram ao teatro e fiquei em casa lendo A PESTE . Não sabia que Luciano estava em casa. Primeiro ele chegou comentando o livro. Falou da condição humana e do flagelo que assolava na época. Talvez ainda hoje o mundo esteja cheios de flagelados, mas naquela época era pior. A guerra, as doenças, enfim... Era um homem culto e inteligente, Luciano. Então ainda conversando sobre o livro ele lembrou de um grande homem e recitou para mim este poema:

A injustiça, Senhores, desanima o trabalho, a honestidade, o bem; cresta em flor os espíritos dos moços, semeia no coração das gerações que vêm nascendo a semente da podridão, habitua os homens a não acreditar senão na estrela, na fortuna, no acaso, na loteria da sorte, promove a desonestidade, promove a venalidade, promove a relaxação, insufla a cortesania, a baixeza, sob todas as suas formas.
De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.


Não suportei que mulher suportaria depois de uma prova de lucidez, amor ao próximo de forma gentil, donairosa, garbosa e picante como essa? Envolvemos-nos, beijamo-nos, rimos e fizemos muito sexo. Amamo-nos sem reserva, filha. Sem pudor ou vergonha do que quer que seja. Então, minha querida, escreva aí também, pois foram nuances que toda amante deve saber. No nosso primeiro amor ele colocou o membro entre meus seios e num movimento de vai-e-vem, entrava e saia na minha boca. Era um membro enorme. Luciano delirava em frenesi e eu também. Para não gozar de vez ele sentou e me colocou por cima. Eu desci eriçada e molhada num pau vergado e muito duro. Afastava as polpas das minhas nádegas e entrava sem dó. Gozei três ou quatro vezes. Em seguida me colocou de quatro e penetrava nos dois orifícios. Alternava o gozo. Fazíamos duas ou três vezes por semana. Ninguém nunca soube. Nesses tempos esqueci o Júlio. Luciano era insaciável, chegava a ser selvagem. Ficava deliciada e mole. Quatro anos no Rio de Janeiro estudando e amando o meu primo Luciano. Ele foi o responsável direto pelo meu excelente desempenho nos cursos que fiz de literatura e magistério. Estudava com mais disposição e houve épocas que achei a razão em Freud. Vivi com essa certeza se tudo estiver bem com a libido o resto não importa. Depois desses anos estava disposta a morar no rio, mas minha tia Luísa e o marido, junto com Luciano, claro, foram para Europa. Meu tio era engenheiro e aceitou o convite de reconstruir algumas cidades européias depois da guerra. Dessa forma, voltei para a boa terra. Não fui morar mais com meus pais. Aceitei o convite de uma escola onde uma das professoras fora interna comigo, a Amanda. Assim cheguei numa pensão no corredor da Vitória. Sim, sim, sempre fora bairro nobre. Lá conheci o Miguel e as nuances do voyeurismo...

SÉTIMA PARTE - 10/06- terça-feira.

terça-feira, 3 de junho de 2008

SEGREDOS E MEMÓRIAS DE UMA MULHER ATRAENTE E DESPUDORADA- quinta parte



Texto do livro AS SETE FACES DE SEVERINA CAOLHA & OUTRAS HISTÓRIAS

A mascara cobre o rosto, mas não esconde o caráter, diria um escritor colombiano. Isso ocorria toda semana, nas segundas-feiras. Pesquisei nos livros da biblioteca sempre disfarçadamente e encontrei o tal gráfico desenhado no chão com sete velas pretas de sete dias. Era o símbolo de um demônio e a hora dele era a meia-noite de toda segunda-feira. Foi descoberto pela irmã Madalena. Engraçado que o rapaz que servia de cavalo para o demônio não lembrava de nada no dia seguinte. Descobri isso através dele mesmo. No início pensei que era uma dissimulação do demônio em carne e osso, mas depois percebi que não. Mas fui flagrada espionando o culto satânico. Uma dessas segundas-feiras, fui espreitar, era a terceira ou quarta vez que ia. Levei Olga comigo, foi meu erro. Ela ficou tão horrorizada que soltou um grito. Tivemos que sair correndo e perseguidas por uma horda de fanáticos. Conseguimos fugir e entrar na sala de música. No entanto todos desconfiavam de nós três do quarto. Eu, Olga e Letícia. Sobretudo eu. Tivemos que contar a Letícia, pois fora acossada por Maria Alcina e Cátia sob o consentimento e a autoridade de irmã Madalena. A Madalena que nunca se arrepende. Mas com muito jogo de cintura e esquivamentos fortuitos conseguimos que nos esquecêssemos. Já havia uma espécie de sindicância naquele convento dos infernos. Não foi só isso. Havia no convento uma interna chamada Felícia. Era cheinha sem ser gorda. Uma vez Letícia descobriu sem querer a razão das regalias que tinha a Felícia. Estávamos brincando de bola. Eu, Olga, Letícia, as demoníacas Maria Alcina e Cátia e outras meninas. Notamos a ausência de Felícia, mas nenhuma de nós nos importamos. Ela era muito metida a besta. E aí se descobriu a razão de tanta soberba exagerada. É incrível como as pessoas sempre tem algo a esconder. Mesmo os mais maduros. Ficam tão maduros que apodrecem. A bola caiu numa escadinha para um antigo porão desativado, eu acho. No meio dessa escadinha havia uma janelinha, bem empoeirada, quase que não dava pra enxergar nada do lado de dentro. Mas enxergamos. A Letícia subiu ofegante e com um riso irônico no rosto, bem sarcástico e zombeteiro. Ficamos todas curiosas. Sete ou oito rostos se espremendo para ver o que havia de fato do lado de dentro daquela janela. Era Felícia, padre Alberto que ia ao convento de quinze e quinze dias e a irmã Margarida. Outra freira do satanás que se mascarava de religiosa para deleitar-se ocultamente. Não vejo razão de se esconder libido, mas... Era um verdadeiro rendez vous. Felícia fazia um boquete em padre Alberto, chupava-lhe a glande. E a irmã Margarida masturba-se, massageando o clitóris com uma escova. Em seguida Padre Alberto penetrava em Felícia que não sabia se ria ou se chorava, mas gritava. A irmã do cão continuava massageando a entre - perna dela mesma, não se cansava. Acho que já havia gozado umas três vezes, pois a gente do lado de fora percebíamos o visgo ao redor das pernas. Uma sacanagem em sua denotação mais pura... (risos) Paradoxal, não é? Depois a felícia aparecia. Horas mais tarde entre nós. Trazia roupas novas e limpas, doces, chocolates e era a única que comia na mesa dos religiosos(risos). Provavelmente faziam aquilo há anos. Depois soube que as meninas que participavam do”ferro na boneca” (risos) por assim dizer, desapareciam misteriosamente.

Aos poucos fui lembrando do Júlio com menos intensidade, até sair e ir para o Rio de Janeiro...

SEXTA PARTE- sexta-feira 06/05